quinta-feira, maio 04, 2006

Dia-a-Dia no Trabalho - Boca Lacrada não Fala Merda

Todos sabem que eu sempre fui adepto da máxima: "perco o amigo mas não perco a piada". Na empresa, a maioria dos meus colegas já sacou que 97% do que eu falo tem que ser encarado como piada. Confesso que levou um tempinho para que as pessoas não levassem tão a sério meus comentários mas confesso também que eu tenho que colocar limites no meu sarcasmo levando em conta que meus colegas não são brasileiros bonachões e gozadores mas sim belgas sizudos e cheios de escrúpulos.
Descreverei os últimos foras da semana. Sim, somente os da semana senão passarei horas e mais horas tentando me lembrar dos milhares foras que dei desde que comecei a trabalhar:

1) Eu já aprendi, ha muito tempo atrás que, aqui na europa nunca se deve fazer nenhum tipo de comentário maldoso que envolva o holocausto ou a Segunda Guerra Mundial. Minha falta de bom-senso me fez descobrir que deficientes físicos também fazem parte desta lista.

O cenário: Final de tarde, louco pra ir embora pra casa, eu e mais três consultores ainda estávamos debruçados em cima de um projeto de renovação de um prédio que irá alojar alguns departamentos de um banco. Por mais de três horas discutíamos os problemas e soluções em relação aos acessos a todos as áreas do edifício sob a ótica de uma pessoa deficiente física (ou "menos válida" como se diz aqui na Bélgica)

A deixa:
Depois de três horas uma consultora comenta que existe uma preocupação especial por parte do cliente com relação a ascessibilidade pois existe em seu quadro funcional um empregado "menos válido".

O comentário infeliz:
"Um funcionário deficiente só ?!?!?! Nós estamos ha horas discutindo todo o plano de acesso por conta de um só funcionário?!?!? Anota aí no relatório de consultoria: Aconselhamos fortemente a demissão do funcionário inválido e tá tudo resolvido. Posso ir embora?"

O resultado:
Todos pararam de falar, gesticular, rabiscar. O silêncio tomou conta do ambiente e os olhares de reprovação convergiram para a minha pessoa

A saída-pela-esquerda:
"Ok, ok, já entendi. Tô ligando pra minha esposa pra ela deixar meu jantar no microondas que eu vou chegar mais tarde. Qual é mesmo a inclinação da rampa sugerida pelos ergonomistas?"

2) Probidade administrativa não é tema para piadinhas desnecessárias.

O cenário: Eu e o mesmo grupo de consultores acima discutindo as diretrizes legais para adequar algumas particularidades de um projeto no Código Urbano de Bruxelas.

A deixa: Um consultor diz que temos que acessar o arquivo da prefeitura para sabermos quantas vagas de estacionamento existiam no antigo alvará do edifício e implementar o mesmo número de vagas no novo projeto pois o departamento de urbanismo nunca iria permitir um aumento de número de vagas no tal estacionamento.

O comentário infeliz: "Caralho! Voces nunca ouviram falar em suborno ?"

O resultado: O mesmo reação da situação anterior

A saída-pela-esquerda: "É, deixa pra lá. Isso não colou nem com a polícia na última vez que me pararam na estrada por excesso de velocidade..."

3) Reunião com clientes não é palco para extravasar opiniões sinceras:

O cenário: Eu e o mesmo grupo de consultores acima em uma reunião com a diretoria de um banco, apresentando o projeto para um determinado edifício. Os diretores de departamento começam a se estranhar entre eles pois não era possível acomodar a todos nas áreas mais agradáveis do prédio (lê-se: nas áreas ventiladas, ensolaradas e com vista para o rio). Eu propus o deslocamento de áreas gigantescas de arquivos para um setor horroroso e insalubre numa tentativa de privilegiar o uso das áreas "nobres" aos escritórios.

A deixa: O diretor do departamento que acomodava mais de 2.000 m² de arquivos se exaltou e exigiu que seu departamento não fosse dividido pelo prédio, metade em um andar e metade na área horrososa supracitada, e começou a exigir explicações convicentes para tal decisão.

O comentário infeliz: "Meu senhor, com a tecnologia digital que temos hoje eu posso deduzir que seu arquivo-morto só guarda merda. Acho que convém armazenarmos toda essa merda em um espaço de merda."

O resultado: O pior possível.

A saída-pela-esquerda: Uma rápida presença de espírito me fez lembrar da campanha eleitoral do lulla e, antes que o mal-estar tomasse por completo o ambiente, completei: "Gente nasceu para brilhar, então deixemos-os ao sol. Quanto ao arquivo-morto, bem, o próprio nome já diz que será mais adequado deslocá-lo para onde não existe luz, para onde não existe vida".
Todos riram e deram aval para o deslocamento dos arquivos. Até o diretor ranheta aprovou o argumento.


CONCLUSÃO FINAL:
Não sei o que eu estou fazendo ainda por aqui perdendo meu tempo. Vou voltar para o Brasil, me filiar ao PT, lançar minha candidatura para presidente da república. Os conceitos básicos para ser um bom petista (preconceito, desinformação, corrupção crônica, falta de desconfiômetro e cara-de-pau entre outros) eu já possuo.
E eu lá sou cabra de ficar tentando explicar pra europeu mal humorado que lá na minha terra tudo se resolve na peixeira (ou na base do velho jeitinho) ?

3 Comments:

At 5:59 PM, Anonymous Anônimo said...

É como diz o próprio blog né Joe, Life goes on.

 
At 6:35 PM, Anonymous Anônimo said...

em que idioma voce faz essas reunioes?
imagino que seja Frances, mas custo a acreditar que um ex-roqueiro tenha adquirido tal fluencia em Frances em tao pouco tempo!

 
At 8:23 AM, Blogger Fata said...

...Mas meu amigo Joe já era uma fluente em línguas. Coisa impressionante.
Beijos pra ti.

 

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